Por trás da Armadura

Todo processo criativo nasce de uma vontade. Um desejo, uma inquietação. Criar é como se jogar de um precipício… É preciso coragem para inovar, delicadeza e harmonia entre todos os elementos… Talvez seja como cozinhar. Primeiro você escolhe os legumes, leva-os para casa e trabalha com eles. Isso todo mundo faz, mas o que os torna um prato especial, é a maneira como os corta, os temperos que usa e a maneira como você os mistura…

Procurei aqui transcender uma armadura… Encontrar o caminho que me separava do meu próprio destino, das minhas Raízes sufocadas! Por anos reneguei meus ancestrais japoneses e minha cultura, tentando ser aquilo que não era…

Foi mais ou menos assim… Estava assistindo um filme “ Dolls” do Takeshi Kitano, sempre gostei de sua direção de arte, mas este filme simplesmente me fez mudar. Foi um momento Epifânico! Encontrei-me inteiramente com meus antepassados e, sua linguagem poética, fez com que aquela sementinha sufocada em meu peito, brotasse novamente… Não sei bem explicar o que senti… Era como sair de dentro da caverna onde era rodeada por sombras e ver a verdade toda com a luz… Encontrei o que precisava para criar!

Apaixonada pelo teatro “ Bunraku” mostrado no filme, encontrei minha base para esse processo criativo, alem de me apoderar de alguns elementos do teatro “ Kabuki”, a parte mais erótica que nasceu do Bunraku… Estes foram os meus legumes! Os levei para casa através de livros e imagens para começar a criar!

Olhando todas aquelas belas imagens, lendo os textos e toda aquela história que nunca antes tive vontade de saber, fui lapidando minha alma e dando forma aos meus legumes! Procurava ali, um olhar perfeito, um lugar seguro, minha identidade a tão pouco descoberta… Ou talvez, o que sobrou dela em mim…

Tentava passar minha impressão, através de minhas roupas, que por sua vez, eram as minhas expressões! Acho que tudo o que fazia ali, era colocar no papel o meu destino, dando equilíbrio entre os dois hemisférios dentro de mim: o Oriental e o Ocidental, da mesma maneira que dava equilíbrio aos padrões e cores, respeitando o corpo que os vestia! É preciso respeitar os tecidos, seu toque, seu caimento, para então, dar forma e proporções `a ele…

Já havia cortado os legumes, agora, era necessário temperá-los… Agora chegara o momento de colocar nas roupas, sentimentos. Para isso, era preciso dar cor a elas. Buscar aquilo que queria dentro de cada armadura ali criada… Iria partir então do natural, o preto, que é a conclusão de todas as cores, para o singelo, o puro, o branco. Luz e ausência de luz, passando pela paixão, vermelho… Pronto! Temperei minha coleção com preto, branco e vermelho! Estava tudo quase pronto… Faltava agora colocar no prato os legumes, para então, prová-los! Faltava deixar claro a mensagem de minha apresentação!

A roupa tem o poder de esconder ou de mostrar tudo o que você está sentindo… E o que eu queria mostrar ali, era essa transcendência toda presente dentro de mim… Sou assimétrica, disforme! Busquei inspiração nos vestires dos Samurais, nas proporções esculturais dos figurinos o teatro “Kabuki”, na sutileza e delicadeza dos bonecos “Bunraku”.

O Contraponto da Armadura, com a leveza de suas roupas de treinamento, da espada que corta, com os movimentos imagéticos que faziam… Moda é movimento, instintivamente! Era preciso desenhar o tempo. Todo esse tempo que deixei de lado minha parte mais pura, inocente e intocada!

Tinha conseguido realizar este encontro…

E num encontro como este, nada pode dar errado!

Cris Matsuoka, 2006 — texto de apresentação de sua primeira coleção: Por trás da Armadura — Shoo Shoo — ( TCC Anhembi Morumbi)

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